sábado, 31 de dezembro de 2011

Educação: Questões de Metodologia 4

                                                A adopção de uma estratégia clara

Se a educação tem a ver com o essencial das nossas vidas, se nas experiências que o viver nos proporciona ficamos a saber que recebemos tudo e, por isso, devemos tudo, e só quando damos tudo atingimos a meta que é o verbo amar, se a bibliografia acaba de nos revelar tantas e tão diversas vertentes do caminho a seguir, impõe-se agora, antes de entrarmos propriamente no tema, definir a estratégia  que nos permita, no fim do caminho, chegar à meta. Qual a  estratégia para atingirmos a verdadeira meta da educação?

Comecemos pela clarificação da linguagem.
Estratégia, em grego stratós, -oũ, “exército” + ágō, “conduzir”, designava a função atribuída ao estratego ou Chefe Militar de Atenas (Pretor ou Cônsul de Roma) na “condução do exército”, obviamente para alcançar um determinado objectivo  (defesa, ataque, vitória, conquista).
Aproximando-nos do tema educação, encontramos uma palavra de estrutura paralela: pedagogia, em grego pais, -dos, “criança” + ágō, ”conduzir”, que significava a função atribuída ao pedagogo ou escravo encarregado de conduzir a criança no caminho entre a casa e a escola.
Acontece que, remontando da etimologia grega às matrizes indo-europeias, o substantivo grego pais, -dos (como o latim puer, -ri, donde recebemos em português, puérpera, puerícia, puericultura, etc.), procede da raiz *IE Pu-, “rebento de vida”, e o verbo grego ágō procede da raiz *IE Ag-, “empurrar, impelir, levar tudo pela frente”, referindo-se às coisas (as crianças também eram, de algum modo, assim consideradas).
Por outro lado e remontando também à sua matriz indo-europeia, verificamos que educação procede da raiz *IE Deuk-, Duk-, que envolve o sentido geral de  “conduzir, guiar, liderar, ir à frente de todos”, falando dos seres humanos.

Assim, em rigor, impõe-se distinguir entre os sentidos de * IE  Ag-,  e * IE Deuk-, Duk-, entre “ levar tudo pela frente” e “andar à frente de todos”, entre “empurrar” e “conduzir”, entre “estratégia” e “liderança”. A estratégia refere-se à mobilização das coisas (meios, recursos, instrumentos), enquanto a liderança tem a ver com a condução das pessoas.
Mas já na linguagem dos gregos, a partir do deslizamento de sentido da raiz indo-europeia *IE Ag-, “empurrar” para o verbo grego + ágō,  “conduzir”, as duas funções aparecem ligadas e complementares.
Com efeito, considerava-se que o Estratego da antiga Atenas, após definir bem o seu objectivo militar, empurra o exército, como máquina monstruosa integrada por todos os meios de que dispõe contra o inimigo, caminhando à frente  dos seus homens. Por outras palavras, o mesmo General mobiliza (empurra) todos os meios logísticos e comanda (conduz) as suas tropas, arrasta as coisas e dá exemplo aos homens.
Neste sentido, também hoje, ao definirmos educar como “rentabilizar todas as coisas enquanto condições para que todos os seres humanos cresçam em todas as dimensões até à sua plena realização nos valores”, consideramos que se trata de pôr em movimento tudo e todos, as coisas e as pessoas, todas as coisas ao serviço das pessoas e todas as pessoas a crescerem para os Valores.
Pois é aqui, ao nível dos Valores axiais que temos encontrado – Viver, Saber  e Amar – mais concretamente no âmbito da sua sequência e hierarquia, que podemos descobrir a meta da educação e definir com rigor a estratégia adequada para lá chegar.
Verificamos que educar não visa apenas e menos sobretudo, ao nível do viver ou sobreviver nos campos da produção e gestão económico-financeira, rentabilizar o que recebemos e legal ou ilegalmente adquirimos  para satisfazer as necessidades e gostos de ordem material, para enriquecer e/ou ganhar estatuto social.
Educar também não visa apenas e menos sobretudo, ao nível do saber nos planos do subsistema escolar, da investigação científica ou da promoção cultural, procurar que os seres humanos cresçam no conhecimento, para angariar maiores recursos, compreender os mecanismos da existência pessoal e colectiva, descobrir e  interpretar racionalmente os segredos da existência, da vida e do universo.
Com efeito, para além desses dois patamares, educar é também e sobretudo avançar até ao nível do amar, nos planos ético (dignidade, verdade, liberdade), religioso (tomar consciência do nosso lugar no Universo) e místico (sentir o eu dentro do nós dentro do Todo, que para nós é Mistério).

Deste modo, tendo em conta que em todos os sistemas de Valores de todos os campos do nosso viver, a regra de transações estabelece ser próprio de quem recebe saber que deve dar, de quem se recebe saber que deve dar-se, de quem se recebe todo saber que deve dar-se todo, e que estes movimentos recíprocos constituem a diástole e a sístole do verbo amar, podemos constatar que a verdadeira estratégia do processo educativo será aquela que tudo mobiliza, coordena, dispõe e orienta, para atingir a meta final.
E a verdadeira meta final da educação
                                                               nem é viver melhor
                                                               nem é saber mais,
                                                               mas amar sem limites.